Bernard Cornwell revela-se como um autor que aproveita os espaços em branco que há na História para aí colocar os seus romances, tramas plenas de imaginação de mãos dadas com situações documentadas. Apesar de na sua generalidade a escrita ser magnética, o anterior volume das Saxon Chronicles (The Burning Land) havia sido um longo bocejo de alguma banalidade. Perguntei-me na altura se a vontade do autor em escrever estas narrativas sobre a formação de Inglaterra pelos olhos de um seu longínquo antepassado não se estaria a tornar um enfado e, quando comprei o mais recente volume (Death of Kings) , temi que pudesse ser um desperdício de dinheiro.
Tal não foi o caso e Bernard Cornwell redime-se totalmente nesta obra desse pecado que foi o volume anterior! Com Alfred cada vez mais doente começam as manobras de bastidores para a conquista de Wessex. Os reinos Vikings reúnem tripulações para a vitória final e os reinos Saxões manobram nos bastidores para assegurar que estão na linha da frente da sucessão, todos eles ameaçando o sonho do soberano em unir todas as terras dos Saxões. Peça central de ambas as tramas é Uthred, o senhor da guerra que tem actuado como o Escudo de Mercia, e que neste volume assume a vontade de ser a Espada dos Saxões. Preso por votos de lealdade à irmã de Edward, descendente predilecto de Alfred ao trono, todas as facções vão tentar removê-lo das contas da sucessão.
Pela sucinta descrição da obra dá para perceber que as grandes batalhas, imagem de marca de Cornwell pelo realismo visceral com que as descreve, não serão presença assídua nesta obra. Esse é precisamente o ponto mais forte! A obra que temos em mãos acaba por ser uma agradável mistura de intrigas e jogos de bastidores, sempre com o conflito do pagão Uthred com os beatos cristãos, com a dose certa de confrontos e que culmina com a muito aguardada grande batalha, para que então os adeptos mais tradicionalistas não se sintam defraudados.
A narração é, como nos outros volumes, feita a partir das impressões de Uthred o que significa que o leitor vai tendo o desfiar das intrigas à medida que elas são reveladas ao personagem, ou à medida que o personagem as vai resolvendo. Sim, porque neste volume a idade começa a atingir Uthred, com ele a recordar alguns episódios marcantes e a perder um pouco a imagem de bruto que resolve todos os problemas com a espada.
Death of Kings não representa a morte definitiva do autor, da série e muito menos da vontade dos leitores em lerem a sua conclusão , pelo contrário representa o início da sucessão de Alfred e com ela uma nova possibilidade para Cornwell empregar a sua pena a preencher os intervalos da História com batalhas apaixonantes e intrigas saídas de uma das mentes mais marcantes do panorama livresco actual.