Sunday, May 22, 2011

Crónica dos Bons Malandros, Mário Zambujal


 Há uma Lisboa feita de golpes, uma Lisboa de pequenos assaltantes que fazem pela vida, de linguagens secretas, de nomes de guerra. Há uma Lisboa dos malandros. Há tudo isso e seria fácil dizer que esta obra de Mário Zambujal é uma viagem a essa Lisboa. Só que isso não seria verdade!

 A Crónica dos Bons Malandros, que viu a luz do dia pela primeira vez em 1980, é um livro que procura dar razão a quem diz que os trinta são os novos vinte. A julgar pela frescura da escrita os trinta até podiam ser a nova adolescência. O livro encontra-se extraordinariamente bem escrito, facto que hoje em dia pode parecer surpreendente, mas não será tanto se considerarmos a experiência de escrita e comunicação do autor, jornalista de outros tempos, de outras escolas.

 A obra centra-se na história de uma quadrilha de pequenos assaltantes lisboetas, com uma alergia (justificada) a armas, à qual é proposto um assalto à Gulbenkian. Como modo de preparação para o desfecho dessa acção somos levados a conhecer a história dos autores de tão grandiosa empresa e que variado grupo esse é. Há quem tenha nascido com a malandragem no sangue, há quem se tenha visto obrigado a malandrar, há os que se calhar até tinham jeito para outras coisas e no final é impossível não sentirmos alguma afinidade com estes bons malandros e sentirmos alguma pena pelo desfecho final.

 O livro é dos melhores que li em 2011 e o facto de com todo este desfasamento temporal ainda parecer algo novo sem parecer pretencioso reflecte a qualidade da sua escrita, simples sem ser simplista, e que não é mais do que a brisa fresca do Tejo no amanhecer à beira-rio.


Thursday, May 19, 2011

Deixa-me entrar, Tomas Alfredson


 Faz já muito tempo que não escrevo aqui, no entanto não tenho estado parado. Um dos motivos que me tem mantido afastado é a falta de palavras. Em parte para descrever este filme do sueco Tomas Alfredson.

 Será profundamente redutor dizer que este é mais um filme de vampiros. Este não é apenas mais um, este é o filme de vampiros com que todos os filmes de vampiros futuros têm de se comparar. E talvez alguns passados...

 Produto da indústria cinematográfica de onde a noite chega a durar uns meses, este filme de vampiros é mais um produto saído de uma manufactura: uma peça única e inigualável!

 Oskar é um jovem adolescente marginalizado e vítima das partidas de colegas, que vive sozinho com a mãe, que visita esporadicamente o pai e que é em público uma figura recatada e pachorrenta. No entanto sofre em silêncio na longa noite do Norte.

 Eli é uma nova vizinha de Oskar, que se mudou para o apartamento ao lado sensivelmente na mesma altura em que começou uma onda de assassíneos e tentativas particularmente grotescas dos mesmos. Logo aqui o filme começa a distinguir-se, pois não se faz segredo que o autor de tais actos é o pai de Eli e que o faz para lhe poder dar o sangue que ela precisa.

 Também não se esconde a relação que estabelece entre Eli e Oskar, uma relação de código morse, uma relação de confiança, uma relação de revelações e aceitação e uma relação em que se aprende a enfrentar os medos, mesmo que daí venham consequências trágicas.

 As longas estações nórdicas assumem-se como personagens neste filme e tal o devemos a Tomas Alfredson. Os vampiros adolescentes de Alfredson e a sua relação com o mundo dos mortais cintila pela crueza com que a violência do género é apresentada, a história de amor não entra no campo da lamechice e depois de Eli, Kirsten Dunst e a sua Claudia parecem freiras! O guião está escrito para quem consegue interpretar textos acima do 4º ano e a interpretação dos jovens petizes sai favorecida por isso.

 "Deixa-me entrar" agrada a quem gosta de histórias inteligentes, a quem gosta de um bom bocado de entretenimento, a quem gosta do género e a quem gosta de filmes onde as imagens são personagens e dizem cada uma mais de mil palavras.